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Arquitetos: Neri&Hu Design and Research Office
- Área: 1370 m²
- Ano: 2021
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Fotografias:Hao Chen
Urban Village, ou cheng-zhong-cun, é um fenômeno onde os remanescentes de assentamentos pré-industriais estão aninhados em meio a uma metrópole aparentemente moderna. Nantou, local do projeto de reutilização adaptativa da Neri&Hu para abrigar um hotel de onze quartos, é um exemplo disso, situado no coração de Shenzhen, uma cidade florescente com um crescimento surpreendente que evoluiu de uma antiga capital próspera para a urbe superlotada que é hoje. Nela, os visitantes são imediatamente imersos em ruas, praças e becos sem saída onde moradores, vendedores ambulantes e nômades gostam de vagar.
Inspirado no ambiente vibrante dos becos de Nantou, o projeto busca refletir sobre a herança cultural do cotidiano. Cenas diárias – pessoas, objetos e suas configurações – são a fonte primária para o desenho. Para celebrar a vida urbana, a estrutura existente foi rompida, permitindo que tais “incisões urbanas” fomentassem um novo espaço público no interior do bloco de apartamentos anteriormente privado. Ao mesmo tempo, a escavação revelou as muitas camadas materiais e estruturais do edifício como se estivesse em um sítio arqueológico, apenas para permitir que novas intervenções instigassem diálogos inesperados entre o passado e o presente.
Ao longo do processo de pesquisa e design do Nantou City, os escritos de Svetlana Boym sobre o tema da nostalgia reflexiva guiaram o pensamento por trás do projeto. Em vez de simplesmente imitar o passado por seus efeitos materiais superficiais, o projeto procurou desenterrar as possibilidades que poderiam revigorar nossa cultura contemporânea. Uma linguagem tectônica foi desenvolvida para articular dois tratamentos divergentes que sondam a noção de estratificação urbana: o revestimento leve, semelhante a uma tela, como elemento principal da fachada, e um conjunto mais pesado e expressivo na forma de uma cobertura marcante.
Como as cenas movimentadas nos becos abaixo, a paisagem dos telhados de Nantou tem vida própria, com jardins improvisados e fazendas de vegetais surgindo ao longo do horizonte irregular. Para reformular as vistas em constante evolução, um telhado plano flutuante é instalado para criar um panorama marcante da vida nas ruas abaixo e um novo terreno público acima. Abrigando espaços públicos e funções de serviço, os monólitos metálicos da cobertura representam complementos vernaculares que são muito procurados pelos moradores sedentos de espaço.
Para envolver-se na circulação exclusivamente orgânica, que é essencial para o tecido urbano de Nantou, o acesso ao hotel e aos espaços públicos foi projetado para ser entrelaçado na rede de vielas intrincadas encontradas no local. A nova entrada para o hotel é criada estendendo uma rua lateral diretamente para o coração do edifício, como se convidasse vizinhos e amigos para sua casa particular.
Antigo e novo são sobrepostos em todo o edifício para celebrar as ruínas. Assim que o visitante chega, o gesto público de abertura ao longo do eixo urbano é voltado para cima. Uma escada existente, que anteriormente conectava todos os nove andares, foi agora aberta e expandida para criar um novo pátio vertical. Elementos naturais passam das fachadas abertas para as laterais banhadas pela luz zenital. Uma nova escada metálica suspensa dentro do pátio vertical leva o visitante a um percurso pelos quartos de hóspedes nos níveis intermediários e, finalmente, aos jardins públicos da cobertura.
Cortar não significa simplesmente destruir, mas também criar, neste caso, espaços e significados. Ao absorver a urbanidade no edifício, o Nantou City, por sua vez, torna a sua história privada legível e totalmente enraizada no fluxo da cidade. Nessa transformação, a incisão abre um novo portal tanto para o passado quanto para o presente mundano, mas singular.